quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Amilton Alexandre: O "mosquito" que se cala

Amilton Alexandre, o "Mosquito" ( *1959 +2011)
Fiquei perplexo com a notícia da morte do combativo, ferino e abnegado Amilton Alexandre (52 anos), popularmente conhecido por "Mosquito", na terça-feira (13/12) em Palhoça.
Particularmente nunca cheguei a trocar palavras com o Mosquito, mas posso tranquilamente dizer que o conhecia, por dois anos pegava a mesma linha de ônibus que ele costuma tomar para ir a sua residência em Palhoça, era a linha Florianópolis-Unisul, horário das 22h05. Ouvia sempre as opiniões dele sobre os mais variados assuntos que ele compartilhava com os cobradores e motoristas, assim como alguns passageiros que pegavam o ônibus com ele. Com seu inseparável notebook, ele passava a viagem falando sobre o cotidiano político, social e econômico de nosso estado, as relações de poder enfim. O que mais ficava admirado era com sua firmeza e incansável vontade de fazer valer o direito de expressar-se sem medo. Seu ácido blog "Tijoladas" foi a voz das ruas sobre determinados políticos, empresários, famílias que se apoderaram do poder, enfim, o Mosquito dava voz e forma àquilo que as pessoas tem a nítida certezea de que algumas coisas ocorrem mas que por vezes não tem como provar e principalmente coragem para externar publicamente. O Mosquito fazia isso sem o menor temor aparente.
O que mais Amilton Alexandre poderia temer? Ele participou ativamente, no ano de 1979, das movimentações idealizadas pelo DCE Luís Travassos, da UFSC que culminaram com o episódio singular na história catarinense: A Novembrada, onde a visita oficial do então Presidente João Batista Figueiredo foi recebido com vaias, manifestações, xingamentos de uma massa indgnada pelo arrocho salarial, a carestia e, claro, pela Ditatura Militar que, mesmo cambaleante, dava as cartas. O Mosquito foi um dos vários manifestante presos e enquadrados na então Lei de Segurança Nacional. Estudante universitário nos anos 1970 como foi o Mosquito jamais teria em seu vocabulário a palavra MEDO.
Sua escrita virulenta lhe proporcionou mais de 30 processos judiciais, uma série de censuras aos seu blog Tijoladas, várias ameaças de violência física e de morte, além lhe aumentar os problemas pessoais e de saúde. Mosquito não parava mesmo, era um mosquito que encomodava. E como encomodava.
Um dos momentos mais memoráveis em seu trabalho de blogueiro foi o levantamento e a divulgação em primeira mão do grave caso do estupro de uma adolescente que foi dopada por outros jovens e violentada por eles, isso tem uns dois anos. O detalhe é que um dos jovens é filho de um conhecido delegado de polícia da capital catarinense e outro jovem integrante da família Sirotsky, que comanda da RBS que detém um monopólio das comunicações no estado de Santa Catarina. O Mosquito apurou fatos, divulgou no blog e foi alvo de repercussão nacional através da Rede Record. Mesmo que pela conveniência da rede de televisão dos bispos sanguessugas do dinheiro daqueles que buscam a fé, a Record deu ao Mosquito uma amplitude de sua voz, o Brasil soube o que muito se joga para sob o tapete em torno das relações de poder. E Santa Catarina possui uma blindagem dessas figuras incrível e Mosquito a furava com sua incansável indignação e capacidade ímpar de denunciar com dados claros, provas indeléveis.
Mas sua saúde estava lhe dando sinais, além do mais, a inglória tarefe de sozinho segurar o peso e a responsabilidade de ser a voz dos indignados foi cobrando a conta. 
Capa do Blog de Amilton Alexandre, o "Mosquito"
Dias antes,de sua morte (09/12) Amilton Alexandre postou pela última vez em seu blog Tijoladas, o qual posto sua íntegra abaixo:

"Quem tem acessado o blog nas últimas semanas notou um vem e vai de informações, postagens deletadas e até comentários sobre a coragem do blogueiro nas suas manifestações.
O blog foi construído com o objetivo de denunciar corrupção, tratar de assuntos ligados a cidadania e versar sobre os mais diversos temas da blogosfera.
Durante todo esse tempo, minha atividade foi manter o blog com informações e denúncias.
O blogueiro, apesar de muitas vezes advertido, carregou nas tintas contra os políticos. Passou dos limites em alguns casos. Claro, colheu processos e condenações, aos quais recorre.
Mas contribuiu para tentar sanear a política catarinense. Não foram poucos os assuntos tratados aqui  transformados em inquéritos no Ministério Público e ações civis públicas.
Quem achou que havia financiamento de grupos interessados em obter vantagens com o que era publicado aqui, se enganou.
Tanta dedicação ao blog levou-me a um isolamento familiar, com oposição a minha atividade, problemas de saúde e outras dificuldades. Nas últimas semanas acusei o nocaute. Não tenho mais como enfrentar as ameaças e retaliações pelo que publico. É sensato dar um tempo.
Como diz um amigo meu: O que vc ganhou com o blog?
O ganho não foi pessoal, mas coletivo. Talvez um dia eu tenha a resposta para a minha parte.
Agora vou tentar me reestruturar numa atividade menos tensa. Preciso dar mais atenção a quem precisa: eu mesmo.
Passando pelo Cangablog vejo que o arsenal de maldades dos políticos não para. Vou deixar o Canga linkado aqui permanentemente. Devo dar alguns pitacos lá.
Aos meus leitores desejo bom Natal e um Ano Novo com saúde e paz."

(Blog Tijoladas, de Amilton Alexandre. Disponível em cache pelo link: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:zjjmju1PpKUJ:www.tijoladas.info/+Tijoladas&hl=pt-BR&client=firefox-a&gl=br&strip=1. Acessado em 15/12/2011)

E no dia 13 de dezembro sua voz calou-se. Foi encontrado eforcado em sua residência, algo que para os mais íntimos conhecidos não condiz com a personalidade forte de Amilton. Seu falecimento repercutiu entre os blogueiros profissionais, entre aqueles que o conheciam, entre significativa parcela da população que tinha Amilton Alexandre como seu porta-voz. Na rede social Twitter seu nome foi um dos mais citados no Brasil pelos usuários. Os blogues dos jornalistas Moacir Pereira e Luís Nassif divulgaram o fato, outros diversos blogues multiplicaram a notícia de sua morte. O jornalismo denúncia, combativo e perspicaz perde uma importante voz. Sua morte sem dúvida vai além de um suicídio, as amaeaças foram muitas aos longo de sua vida e precisa ser investigada até o fim.
Deste que só o viu e ouviu durante vários de meus regressos da faculdade para casa na linha Florianópolis-Unisul das 22h05 é a minha contribuição par que sua memória não se apague, que a indignação dele seja incentivo para que muitos não se calem. Amilton Alexandre, combativo líder estudantil do DCE da UFSC em 1979, blogueiro de escrita feroz e voz dos que estão em silêncio e, acima de tudo, um cidadão, rendo meu aplauso e estas linhas.

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